Feira de Santana é a maior cidade do interior nordestino. Localizada
no estado da Bahia, a 110 km da Capital, tem o maior entroncamento rodoviário
do Norte e Nordeste, conta com uma população de mais de 500 mil habitantes e é
uma cidade de grande potencial econômico que tem no comércio, no setor de
serviços e na indústria a base de sua economia. E por todos esses fatores
torna-se muito atraente para aqueles que nós chamamos “artistas de rua”,
pessoas que ganham a vida nos cruzamentos dos grandes centros urbanos,
apresentando a sua arte.
Casado com Mariana Araújo Barbosa, com quem tem três filhos,
decidiu viver a vida da arte nas ruas. Aos doze anos de idade descobriu o
talento para o malabarismo e sua vocação circense. “Tinha quatorze anos de
idade quando decidi sair de casa e da minha cidade, Fortaleza, rumo ao Rio de
Janeiro, pois acreditava que lá poderia ganhar dinheiro com minha arte, que
aprendi sozinho mesmo”.
É com isso que sustenta sua família, enviando semanalmente o
dinheiro para suprir a despesas de casa, não só de alimentação como também de escola,
saúde e lazer. Segundo ele, consegue arrecadar cerca de dois mil reais livres
das despesas de passagens, hospedagem e estadia. Lamenta-se apenas de ter que
ficar distante dos filhos e da esposa, por muito tempo, cerca de trinta dias,
um período que considera longo e que parece não passar. Por outro lado, destaca
o fato de conhecer várias cidades e pessoas diferentes.
Renato não tem pretensão de deixar o seu trabalho tão cedo.
Ele busca todos os dias trabalhar com prazer para juntar dinheiro e comprar um
carro com trailler no intuito de trazer sua família para perto de si.
Fábio é solteiro, tem 22 anos, não tem filhos, mas exerce a
mesma atividade para sobreviver. Faz mágica e brincadeiras nos cruzamentos das
grandes e movimentadas avenidas.
Vestido de palhaço, com pernas de pau e rosto pintado, Fábio
faz a alegria de quem para nos semáforos, com seus truques e mágicas em plena
luz do dia. É nisto que reside o prazer daquilo que faz. “Arrancar um sorriso
de pessoas que nunca vi, mas que com certeza tem problemas, pra mim, é mais do
que gratificante, é a sensação de um dever cumprido”, relata com muita
segurança.
Estudante do curso superior de designer, trancou a sua
matrícula no terceiro semestre para sair Brasil a fora fazendo o que mais
gosta, e tirando daí o seu sustento. Apaixonado pela arte, mas também
simpatizante da filosofia, principalmente de grandes pensadores sociais, como Émile
Durkheim e Max Weber, diz que se tiver de voltar para a faculdade será para
estudar arte.
Cheio de alegria e entusiasmo, Fábio sente-se importante na
sua rotina de trabalho. Para ele o trânsito é muito estressante, o que deixa as
pessoas tensas, e aí é que entra a sua arte, a atividade de fazer sorrir e
relaxar os que aguardam pelo sinal. Ainda que não seja reconhecido e
recompensado monetariamente, tem sempre o prazer de fazer suas brincadeiras com
todos. “É bem verdade que todo palhaço deve fazer sorrir, porém não quer dizer
que não enfrente problemas e dilemas, mas que jamais serão transferidos para
seu público alvo”.
Com um jeito típico de carioca, Fábio diz gostar do povo
nordestino pela sua cultura e pela fibra com a qual enfrenta as dificuldades,
maiores que a dos brasileiros que vivem nas regiões sul e sudeste do País.
Prefere trabalhar nas cidades nordestinas do que nas de sua terra natal, Rio de
Janeiro. “Aqui as pessoas são mais amigas e solidárias, apesar de darem pouca
grana ao artista”.
Acordar tarde, sair de um quarto de hotel ou pousada e ir à
luta de dia e de noite não é tão simples como alguém possa imaginar. Ter que
fazer quase tudo na rua, como atender as necessidades fisiológicas, comer,
beber água e ter que ficar a maior parte do tempo sob o sol nordestino não é
nada fácil para qualquer um, mas é assim que escolheu viver o jovem palhaço
Fábio.
Com uma rotina semelhante à da maioria dos outros artistas
de rua, Henrique Gomes da Silva sobrevive de fazer malabarismo com bolas. Nascido na cidade de São Paulo, solteiro,
decidiu abandonar o emprego de carteira assinada que tinha numa indústria
multinacional onde ganhava razoavelmente bem. “Não gostava daquela coisa de ter
que todos os dias acordar cedo, marcar ponto, ter hora para comer, chegar e
sair, etc. Na verdade, não gosto de limites, de ter que dar satisfações a
ninguém”, declara.
Nessa rotina, não
ter que prestar contas a ninguém pode ser interpretado como viver sem controle,
mas não é isso que foi percebido. Henrique demonstra compromisso com a
civilidade e defende direitos iguais para todos.
A atividade de
sobreviver da arte nas ruas, também tem seus riscos, como qualquer outro
trabalho. É fácil ver que ficar no meio de um cruzamento ou parado sobre uma
faixa de pedestre de movimentadas avenidas não é nada seguro, visto que o
trânsito em si é muito perigoso e nunca se sabe quem está ao volante ou
pilotando uma motocicleta. “Já vi acidentes horríveis e por pouco não fui
vítima. Mas nunca pensei em parar por causa disso; faz parte da minha
profissão”, comenta Henrique.
Outra situação
enfrentada pelos artistas de rua é o preconceito e a discriminação por parte
dos motoristas e pedestres. Não é o fato de não contribuir ou não cooperar com
o artista, pois isso não significa quase nada perto dos maus tratos cometidos
por alguns. Eles são xingados, tratados como viciados; outros aceleram o carro
em direção ao artista ou até mesmo fecham o vidro como demonstração de
menosprezo. Mas nada disso é motivo para desistirem.
Renato, Fábio e Henrique são exemplos de brasileiros que não
desistem nunca, pois, apesar das dificuldades, conseguem ter esperança de que
tudo é possível se acreditarem. Um sustenta a família com seus malabares
fumegantes; outro alegra os que passam, lá das alturas de sua perna de pau e o
outro com malabarismo de bolas e cuspindo fogo. Juntos, tem em comum a
realização pessoal e profissional, pois trabalham com o que gostam, e o que
sabem fazer melhor, que é fazer o outro sorrir.
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